sábado, 2 de junho de 2007

Nasce “O Catharinense”


Desterro, 2 de julho de 1831.
Gabriel Baggio

Uma estranha máquina chamou à atenção de quem passava pela rua do Livramento, no Desterro, Capital da Província de Santa Catarina, nessa terça-feira, 2 de julho de 1831. Em pleno centro da cidade, aquela estranha máquina, aportada no meio da sala de visitas, despertava a atenção de quem por ali passava. Era algo novo aos olhos dos manézinhos e não demorou muito para que uma fila enorme de curiosos ali se formasse.
A guarda do império compareceu para ver o que se passava, devido a grande movimentação. Não constataram nada de anormal, a não ser a máquina de grandes proporções fixada e trabalhando a todo vapor no meio da sala. Todos, aglomerados na rua, estavam muito curiosos com o que presenciavam, nunca haviam visto nada parecido. Também surpreso com a aglomeração à sua porta, o homem de aparência distinta, sereno, desses que impõem respeito, saiu à rua e começou a matar a curiosidade de todos. Um rapaz de aparência humilde tomou a frente e foi logo disparando algumas perguntas ao recém chegado.

Pergunta: Qual o nome do senhor?
Jerônimo Coelho: Chamo-me Jerônimo Francisco Coelho.

P - E sua idade?
JC - Tenho 25 anos.

P - Você é natural desta região?
JC - Sim, sou catarinense, nascido na cidade de Laguna, no ano de 1.806. Tenho muitas saudades de lá, fiquei muito tempo fora.

Pergunta - No exterior... navegando...?
JC – Não. Sou militar. Desde os 18 anos sirvo ao Exército de sua Majestade. Nos últimos anos estive a serviço no Rio de Janeiro.

P - E para que serve essa máquina no meio de sua sala?
J – Essa máquina se chama prelo. Estou trabalhando para fazer um jornal. Dela sairá o primeiro jornal de Santa Catarina. E se tudo der certo, vai circular por muitos anos e por toda Província. É com essa máquina que o jornal é impresso e reproduzido.

P – O jornal já tem nome?
JC - Irá se chamar “O Catharinense”. Não consegui visualizar outro nome que se identificasse com nossa Província, que a cada dia fica maior.

P – Afinal, para que serve um jornal?
JC – Serve para as pessoas saberem o que está acontecendo na sua cidade, na sua Província, em todo Império. No jornal todos poderão ler notícias sobre os acontecimentos políticos, coisas da sociedade, anúncios do comércio, dos espetáculos culturais, do dia a dia da cidade.

P - Quando será o dia de inauguração do jornal?
JC - Hoje será rodada a primeira edição. É um momento histórico para o povo de Santa Catarina.

P - E como será esse jornal?
JC - O lema é “União e Liberdade, Independência ou Morte”. Será um semanário de 15,3 x 21,5 centímetros, com seis páginas. Irei ressaltar os problemas da província e reservarei um espaço exclusivo para manifestações populares. Acredito na política liberal e na liberdade individual de cada um. Gosto de saber o que se passa no império. Agora, vou colocar tudo no jornal.

P -Terá ajuda de alguém na confecção desse jornal?
JC - No primeiro momento não. Quero perceber a receptividade do jornal aqui na região. Dependendo da aceitação, pensarei se terei condições de dar continuidade ao jornal. De início, serei o redator, editor, compositor e impressor.

P – O senhor já fez jornal em algum outro lugar?
JC – Não, mas li bastante no Rio de Janeiro. Lá na Capital do Império, todo mundo lê jornal, muita gente escreve e manifesta suas idéias através de jornais. Por isso, acho que vai dar certo. Acredito que as pessoas precisam saber o que está acontecendo na Província e em todo território brasileiro.

P – “O Catharinense” vai criticar o imperador dom Pedro?
JC - Posso dizer que “O Catharinense” terá como bandeira ser o “Sentinela da Liberdade” e lutará em nome da honra do povo brasileiro. Por isso, na capa virá inscrita seguinte frase: “União e Liberdade, Independência ou Morte”.

P – Se eu quiser ler o primeiro número. Sairá quando?
JC – Amanhã bem cedo já estarei vendendo aqui na minha casa e também em algumas casas do comércio aqui na rua do Livramento. Pretendo também vender assinaturas por três meses para a pessoa receber o jornal em casa.

P – O senhor vai ser jornalista para o resto da vida?
JC – Não sei. Meu sonho é fazer jornal, mas também tenho minha carreira militar e gosto muito de política. Tenho um outro sonho, de ser deputado provincial para defender os direitos de liberdade dos brasileiros frente à resistência dos portugueses.

P – Alguma coisa do jornal já está pronta?
JC – Na capa, teremos a apresentação do jornal com o motivo de seu lançamento. A partir de agora, a inocência da província não terá que gemer em silêncio, e aqueles que a oprimirem terão de ser dados como opressores da humanidade. Vamos dizer que dom Pedro I é um estúpido, avarento e doido, que há pouco, espavorido, abandonou as praias do solo americano. Vamos convidar os provincianos a combater esses orgulhosos mandões que, comumente, nas povoações pequenas, costumam ser o flagelo dos fracos.


Trabalho produzido para a aula de redação jornalística 3
novembro de 2006

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